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João Batista no Altar de Isenhem (Luzius Zaeslin)

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UMA OBSERVAÇÃO DE SUA REPRESENTAÇÃO NO ALTAR DE ISENHEM DE GRUNEWALD EM COLMAR

A figura do profeta na cena da crucificação nos impressiona e é tema de capa deste NÒS. Novamente queremos observar uma pintura descobrindo nas suas cores e nos seus traços as possibilidades interessantes de análise e interpretação.
 
Observamos o conteúdo: na frente de um fundo preto e cinza escuro encontra-se a figura poderosa e presente de João Batista em cores vivas. Posiciona-se firmemente no chão com os pés bem colocados no solo. As cores são vivas, tanto as da pele como também da roupa. Impressiona o forte contraste do seu dedo apontando para o corpo do Cristo no centro. Notamos o seu olhar forte, decidido e consciente como se estivesse explicando a cena que se passa a alguém que está olhando para o altar.
 
A sua vestimenta é a roupa tradicional do João Batista, pele de camelo, pois vivia no deserto do lado do rio Jordão. Aos seus pés encontramos o carneiro, também símbolo de João Batista, um animal forte carregando uma cruz na cabeça erguida. Do seu peito jorra o sangue para dentro do cálice, o sacrifício do Cristo.
 
Historicamente este João não pertence à cena pois já tinha morrido. Grunewald, porém, colocou-o na composição com um objetivo claro: um contrapeso para a parte da esquerda formada pelo grupo de João, o Evangelista, segurando Maria, mãe de Jesus, que desmaiou em seus braços, junto à figura de Maria Madalena ajoelhada na frente em desespero, rezando.
 
Esta composição é muito interessante: No centro o crucificado, à sua esquerda o grupo dos envolvidos na tristeza da cena e à direita a figura forte do profeta João. O texto atrás dele revela a sua missão, palavras próprias dele: ”Illum oportet crescere me eutem (di) minui” (o di esconde-se atrás da mão), Ele deve crescer, porém, eu devo diminuir.
 
Por que estas palavras e por que Grunewald as usou como fundo do João?
 
Sabemos que João batizava as pessoas no rio Jordão. Isto era realizado mergulhando-as dentro da água ao ponto de elas quase se afogarem. Neste momento de uma aproximação à morte acontece a retrospectiva onde de relance aparece toda a vida em imagens. Era, então, uma forma de iniciação provocando uma ruptura drástica com a vida, possibilitando à pessoa, entre outras coisas, a visão do seu passado. Entendemos assim que João era um representante desta velha forma de iniciação, já praticada no Egito. As suas palavras ganham um novo sentido dentro desse contexto: Eu, representante da antiga forma de iniciação devo diminuir e Ele, Cristo, representante de uma nova consciência deve crescer. A iniciação não deve mais ocorrer através de um sacerdote ou guia, como era antes. Em decisão livre o discípulo poderá adquirir os conhecimentos espirituais pelo próprio trabalho orientado na fonte do Cristo. É uma figura forte como este João nos indica a mensagem.
 
Existe mais uma relação interessante ao compararmos as cores do João batista com o João Evangelista. Ambos vestem o vermelho como cor que se destaca fortemente do fundo. Porém, toda energia que da figura dominante de João Batista parece chegar pelo movimento da mão ao outro lado. Lá o grupo das três figuras parece inclinar-se para trás recebendo esta força.
 
Será que existe uma relação neste sentido entre as duas figuras de João? Temos outros exemplos de apresentações deste tema apontando claramente para isto na pintura de A. Altdorfer: “João em Patmos”.
 
Vemos aqui João batista ensinando e inspirando João Evangelista, que está escrevendo o Apocalipse. Outra vez encontramos em João batista a postura ativa de quem assume a liderança. Também segura o livro e faz o gesto de mão indicando João Evangelista, que está em posição de receptividade pelo conteúdo, olhando para cima onde vê a aparição celestial de Maria.
 
Ambas as pinturas foram realizadas em 1510, porém, não se cogita de que os dois pintores tenham se encontrado. Mesmo assim cada qual de sua maneira expressou um conteúdo parecido; Grunewald pelo uso das cores e expressividade das formas, Altdorfer pela representação exuberante da natureza, uma característica constante nas suas pinturas. Ele tem a visão de que o homem é pequeno diante da natureza, obra magnífica de Deus. Assim sempre encontramos paisagens com a natureza exuberante e a figura do homem protegida dentro dela.
 
Olhemos finalmente para mais um exemplo do pintor Macchiavelli mostrando uma ligação de carinho entre as duas figuras de João. Estamos sensibilizados diante do caráter terno, íntimo dado pelo formato em forma de arco pela moldura e as duas cabeças, em mesma altura levemente inclinadas, cada uma para o seu lado. As duas auréolas formam a geometria perfeita da composição em simetria.
 
Percebemos então que na forma da pintura (cores, composição) grandes conteúdos são revelados, dos quais os artistas tinham clara noção.
 
 
(texto extraído da Revista Nós, Época de São João 2002, da Escola Waldrof Rudolf Steiner, em SP)