Textos Rudolf Steiner
Pentecostes Universal - A Mensagem da Antroposofia (Rudolf Steiner)
Título Original: Welten-Pfingsten die Botschaft der Antroposophie
G.A. 226 17.5.1923 Oslo (*)
Tradução: Leonore Bertalot; Rvisão: Ricardo Távora
Publicado pelo Instituto Elo de Economia Associativa – Botucatu - SP
Quando olhamos para o passado histórico da humanidade, percebemos acontecimentos de maior e menor amplitude que influenciaram a sua vida como um todo. O maior de todos é aquele que chamamos o mistério do Gólgota (**), por meio do qual o cristianismo se inseriu na evolução da humanidade.
Esse mistério do Gólgota, quando ocorreu, foi compreendido de maneira bem diferente do que em tempos posteriores. E em nossa época, deve ser novamente compreendido e assimilado diferentemente. Compreender esse mistério do Gólgota de forma correta no sentido da época atual é a tarefa da Antroposofia.
Devemos retroceder para épocas antigas, em que os homens possuíam uma consciência bem diferente da nossa de hoje. Três ou quatro milênios atrás, os homens possuíam a consciência instintiva de terem vivido num mundo espiritual antes de descer para a Terra num corpo físico. Todo homem sabia, naqueles tempos, que no seu íntimo vivia um ser anímico-espiritual enviado pelos poderes divinos para a existência terrestre.
Também nesses tempos longínquos, tinham os homens uma consciência bem diferente da morte. Eles sabiam que o seu ser espiritual interior, que antes vivera na existência espiritual pré-natal, continua vivendo além da morte.
Naqueles tempos distantes existiam escolas de iniciação, que simultaneamente eram centros religiosos, chamados mistérios. Nessas instituições ensinava-se o que podia ser conhecido sobre a existência pré-natal, ou seja, anterior à descida à Terra. Assim, os homens aprenderam que eles viviam, antes da existência terrestre, entre estrelas e seres espirituais, assim como na Terra viviam entre plantas e animais, montanhas e rios.
O homem dizia para si mesmo: “Desci do mundo estelar para a existência terrestre”. Porém, ele sabia que as estrelas não são apenas algo físico, sabia que cada estrela é habitada por poderes espirituais com os quais ele tinha uma relação no mundo espiritual antes de haver descido à Terra.
E o homem sabia que com a morte, em que devia abandonar o seu corpo físico, ele retornava ao mundo estelar, isto é, ao mundo espiritual. E o sol, com seus seres, entre os quais o mais elevado era chamado o grande ser solar, era visto como o mais importante dos astros.
Dos centros de mistérios chegou aos homens a doutrina de que esse elevado ser solar lhes dava, antes de descer à Terra, a força para, após a morte, retornar aos mundos estelares espirituais. Os mestres dos mistérios diziam aos discípulos e esses, diziam ao povo: “A força espiritual do sol é a luz espiritual que os acompanha para além da morte e que vocês trouxeram consigo, quando, ao nascer, entraram na existência terrestre”.
Os ensinamentos dos mistérios continham muitas orações e grandes conteúdos, todos louvando, exaltando e descrevendo o elevado ser solar. E os mestres ensinavam aos discípulos, e estes à humanidade em geral, que o homem, depois de passar pelo umbral da morte, precisa penetrar na esfera das estrelas, dos seres estelares inferiores, para então se elevar além do Sol. Porém, isto não lhes seria possível, se não lhe fosse dado pelo ser solar a força necessária para isso. Os homens que compreenderam isto sentiam o calor no seu coração, quando podiam elevar-se em oração ao espírito solar, que lhes dava a imortalidade.
Os textos e exercícios de devoção dirigidos ao Sol agiam sobre os sentimentos e as afeições dos homens. Eles se sentiam ligados ao deus do cosmo, quando podiam realizar o culto ao Sol. Nos povos em que a veneração do Sol era tradição, existiam rituais de sacrifício e cerimônias organizadas para esse fim.
Esse ritual solar consistia, em geral, de uma cerimônia em que a imagem do deus era enterrada e, depois de alguns dias, retirada do túmulo novamente, como um sinal de que no cosmo existe um deus, o deus solar, que ressuscitará o homem para a vida toda vez que ele sucumbir à morte.
Durante o ritual os sacerdotes diziam aos discípulos o que estes deviam proclamar à humanidade: “Este é o sinal de que vocês, antes de descerem à terra, viviam no reino espiritual em que está o deus do Sol.”
Diziam aos fiéis desse ritual solar: “Se vocês elevarem o seu olhar, verão o sol brilhando; porém, isto é apenas a manifestação externa do ser solar. Atrás deste brilho está o deus solar, que vos assegura a imortalidade.”
Assim, os homens, ao aprenderem essa mensagem, sabiam que tinham descido dos mundos espirituais para o mundo terrestre, esquecendo o mundo em que se encontra o deus solar.
“Vocês abandonaram o reino do deus do Sol ao nascer. Deverão reencontrá-lo, por meio da força que ele colocou em seus corações, quando passarem pela morte.” – Isto diziam os sacerdotes aos seus fiéis.
Os sacerdotes iniciados nesses mistérios sabiam que o grande ser solar de que falavam aos discípulos era aquele que no futuro seria conhecido como o Cristo. Porém, antes o mistério do Gólgota esses sacerdotes precisavam falar aos fiéis da seguinte forma: “Se vocês quiserem saber algo sobre o Cristo, não poderão encontrar este ensinamento na Terra; é necessário que vocês se elevem aos mistérios do sol, que só se encontram fora da Terra.”
Em geral, para os homens que ainda possuíam uma lembrança instintiva do reino do Cristo, não eram difícil aceitar tais doutrinas.
Mas, no desenvolvimento da humanidade, os homens foram perdendo gradualmente a lembrança instintiva da sua vida espiritual pré-terrestre. Oitocentos anos antes do mistério do
Gólgota só pouquíssimas pessoas ainda conservavam a lembrança instintiva da vida espiritual pré-terrestre.
Imaginem, meus caros amigos, o homem passando pela morte. Ele entra nas amplidões estrelares, passando por regiões em que vê as estrelas pelo outro lado; quer dizer, também o Sol é visto do outro lado. Nós nos acostumamos a ver o Sol do ponto de vista da Terra. Quando morremos, partindo para o espaço cósmico, podemos perceber o sol do lado oposto.
Então não veremos um disco físico, mas um reino de seres espirituais. E, antes do mistério do Gólgota, víamos, depois da morte e antes do nascimento, o Cristo no outro lado do sol. E esta visão do Cristo os mestres dos mistérios podiam fazer os discípulos relembrar, porque tinham a capacidade de despertar a seguinte imagem: “Antes de viver na Terra, eu via o Sol do outro lado.”
Assim era nos tempos antigos, antes do mistério do Gólgota. Começou então uma época em que já não era possível despertar essa lembrança nos homens. Em torno do oitavo século antes do mistério do Gólgota, foi ficando cada vez mais difícil despertar essa lembrança da visão do Cristo no sol espiritual, vivenciada na existência pré-terrestre.
E, assim, os mestres dos mistérios não podiam mais dizer aos homens para elevar o olhar ao Sol, onde se revela o Cristo. Estes já não o entenderiam. E a vivência dos homens na Terra era como se estivessem abandonados pela força do Cristo, não lhes sendo mais possível reavivar a lembrança da vida no mundo espiritual.
E, vejam, só então se espalhou entre os homens aquilo que se pode chamar o medo da morte. Pois, anteriormente, eles viam morrer o corpo físico; porém, sabiam que, como almas, eram moradores do reino do Cristo e não morriam.
Cresceu então nos homens a preocupação com o próprio destino do seu ser eterno interior e imortal. Parecia que a relação entre o Cristo e os homens tinha sido rompida. Isso porque os homens não mais conseguiam elevar o olhar aos mundos espirituais e, na Terra, o Cristo não podia ser encontrado.
Vejam, meus caros, justamente no tempo em que os homens não mais podiam encontrar o Cristo além do Sol, no supra-terrestre, ele, por sua infinita graça e infinita misericórdia, desceu à Terra, para que eles pudessem encontrá-Lo na vida terrestre.
Com isso aconteceu na evolução do universo algo que não se compara com nada que o homem possa conhecer. Pois todos os seres superiores ao homem – dos anjos, arcanjos, arqueus, etc, aos seres divinos mais elevados – passam no mundo espiritual somente por transformações, metamorfoses. Não nascem e morrem. Dizia-se nos mistérios, naqueles tempos: “Apenas os homens conhecem o nascimento e a morte: os deuses só conhecem a metamorfose, eles não conhecem o nascimento e a morte.”
Como, então, os homens não mais podiam alcançar o Cristo Ele veio viver com os homens na Terra. Para realizar isto, foi necessário que ele vivenciasse o nascimento e a morte, o que até então nenhum deus fizera. O Cristo se tornou alma de um homem, Jesus de Nazaré, e passou pelo nascimento e a morte. Isto é, pela primeira vez um deus passou pela existência da morte humana.
O aspecto essencial do mistério do Gólgota é ser um assunto dos deuses e não apenas dos homens. Os deuses decidiram que um deles, o grande ser solar, deveria ligar o seu destino ao da humanidade, até o ponto de passar pelo nascimento e a morte.
E, a partir dessa época, os homens sempre podem contemplar os acontecimentos do mistério do Gólgota e, assim, encontrar o Cristo, que perderiam em função da evolução de sua consciência, que não alcançava os céus.
Os discípulos e apóstolos de Cristo, que vivenciaram em primeiro lugar esses mistérios do Gólgota, ainda possuíam uma pequena herança de uma consciência instintiva sobre aquilo que tinha acontecido ali. Eles sabiam que o mesmo ser, que antigamente só podia ser alcançado por uma elevação capaz de alcançar a esfera espiritual do Sol, este mesmo ser encontramos agora, quando compreendemos de forma correta o nascimento, a vida, a paixão de Jesus Cristo.
No tempo do mistério do Gólgota existiam, poucas pessoas que ainda sabiam que aquele que viveu em Jesus de Nazaré como o Cristo era o grande ser solar que descera à Terra.
Até o quarto século depois do mistério do Gólgota havia ainda pessoas que sabiam que o Cristo
Que viveu em Jesus de Nazaré eram a mesma entidade.
E é especialmente comovente saber pela ciência Espiritual como nos primeiros séculos da era cristã os homens assim rezavam com fervor: “agradecemos ao Deus Cristo, do qual viveríamos afastados, por ter ele descido do mundo espiritual até nós aqui na Terra!”
Nos tempos que seguiram ao fim do quarto século da era cristã, não se poderia mais conceber que o grande ser solar, o Cristo, fosse a divindade que assegurava a imortalidade a cada homem. Desde esse quarto século até os nossos dias existia então apenas o testemunho escrito dos evangelhos, que conta de forma histórica que aconteceu o mistério do Gólgota. Mas este testemunho dos evangelhos teve durante esses séculos um efeito tal, que os homens podiam voltar o seu coração para o mistério do Gólgota.
Hoje, porém, estamos numa época em que os homens, tendo aprendido tantos conhecimentos sobre os mistérios da natureza, perderiam qualquer relação com a palavra dos evangelhos, se não houvesse um novo caminho para nos aproximar do Cristo. Este caminho a Antroposofia quer abrir, levando os homens novamente ao conhecimento do mundo espiritual. Pois, vejam, o acontecimento do Cristo só pode ser compreendido como algo espiritual, como um fato espiritual. Quem não puder compreender o acontecimento do Cristo como um fato espiritual, não o entenderá mesmo.
Com os conhecimentos antroposóficos podemos novamente retornar ao tempo em que Jesus Cristo caminhava na Palestina, a realizar o seu destino terrestre. Podemos penetrar na vivência anímica dos discípulos e apóstolos, que sabiam, conforme seus conhecimentos instintivos: “o ser que outrora só vivia no Sol, desceu à Terra e caminhou entre nós. Esse ser, que viveu entre nós como Jesus Cristo e dessa forma caminhou pela Terra, só podia ser encontrado anteriormente no Sol.”
Portanto, os discípulos diziam o seguinte: “pelos olhos de Jesus de Nazaré brilha a luz do sol; pelas palavras pronunciadas por Jesus de Nazaré fala-nos a força do Sol que nos aquece; quando Jesus de Nazaré caminha entre nós, é o próprio Sol que envia a sua luz e sua força para o mundo.”
E assim pensavam aqueles que podiam compreender estas coisas: “então caminha entre nós num homem o ser solar que outrora só podia ser alcançado quando a contemplação era dirigida da Terra para cima, para o próprio mundo espiritual.”
E, pelo fato de os discípulos e apóstolos terem podido pensar dessa forma, tinham eles uma correta relação e uma correta compreensão da morte do Cristo. Por isso, eles continuaram sendo discípulos de Cristo Jesus, mesmo depois que Ele já tinha atravessado a morte na Terra.
E sabemos, pelos conhecimentos da Ciência Espiritual, que o Cristo depois de abandonar o corpo de Jesus de Nazaré, continuou entre os seus discípulos, ensinando-lhes.
A força que os discípulos e apóstolos receberam, para que o Cristo, quando Este lhes aparecia somente em seu corpo espiritual, pudesse continuar a lhes ensinar, essa força eles perderam depois de algum tempo. Houve um momento na vida dos discípulos de Jesus Cristo em que esses diziam para si mesmos: “nós O vimos, mas não O vemos mais. Ele desceu para estar entre nós na Terra, para onde Ele foi agora?”
O momento em que os discípulos pensaram ter perdido novamente a presença de Cristo se comemora com a festa cristã da Ascensão do Senhor. Ficou conservado na lembrança o fato de que desaparecera da visão dos discípulos o grande espírito solar, que viveu na Terra, no homem Jesus de Nazaré.
Esta experiência trouxe para os discípulos do Cristo uma tristeza tão profunda, que não se pode comparar com nada que possa existir como tristeza na Terra.
Nos antigos mistérios, quando a imagem do deus era enterrada, na celebração do ritual solar, para só reaparecer depois de três dias, as almas dos fiéis também eram dominadas por uma grande tristeza pela morte do deus. Mas essa dor não se compara em intensidade com aquela que invadira então os corações dos discípulos do Cristo.
Vejam, meus caros amigos, todo grande e verdadeiro conhecimento nasce da dor e da tristeza. Se alguém quiser, por meio dos exercícios iniciáticos descritos na ciência espiritual antroposófica, tentar trilhar o caminho que conduz aos mundos superiores, só alcançará a meta se passar pela dor. Sem ter sofrido, e sofrido muito e, por isso, ter-se libertado do peso opressor da dor, não é possível conhecer o mundo espiritual.
Os discípulos passaram por um imenso sofrimento, por terem perdido a visão do Cristo durante os dez dias que seguiram à Ascensão do Senhor. E dessa dor, dessa infinita tristeza, surgiu o que chamamos o Mistério de Pentecostes. Os discípulos que, para a clarividência instintiva externa, perderam a visão do Cristo, conseguiram encontrá-Lo outra vez na experiência interior, no sentimento, na vivência, graças à tristeza e à dor que sofreram.
Voltemos ainda aos tempos antigos. Os homens que viviam antes do mistério do Gólgota possuíam uma lembrança da sua existência pré-terrestre. Eles sabiam que haviam conseguido nessa existência, antes de vir à Terra, a força do Cristo para conquistar a imortalidade.
Sabia-se então que, por meio da própria força humana, não era possível olhar retrospectivamente para os mundos espirituais da existência pré-terrestre. Os discípulos concentraram então a sua atenção em tudo aquilo que existia em sua memória, sobre os acontecimentos do Gólgota.
E dessa memória, acrescida por aquela dor, ressurgiu-lhes na alma a visão daquele que o ser humano perdera, ao desaparecer a sua clarividência instintiva.
Os homens da antiguidade podiam dizer: ”nós estivemos com o Cristo antes de nosso nascimento na Terra. Dele recebemos a imortalidade.”
E dez dias depois de terem perdido a visão exterior do Cristo, os discípulos puderam dizer: “nós vivenciamos o mistério do Gólgota. Isto nos dá a força para sentir novamente o nosso ser imortal.” Este acontecimento é expressado simbolicamente pela imagem das línguas de fogo.
Daí podermos, por meio da ciência espiritual, entender também que, com o mistério de Pentecostes, o mistério do Gógolta substituiu o antigo mistério do mito solar.
Que o Cristo é o deus solar tornou-se especialmente claro a Paulo, quando da sua visão em Damasco. Paulo era discípulo dos iniciados dos antigos mistérios. Ele aprendeu que só podemos encontrar o Cristo quando alcançarmos o mundo espiritual através da clarividência.
E ele dizia: “Eis que existem discípulos que afirmam ter o ser solar vivido num homem e ter passado pela morte. Isto não pode ser correto, pois o ser solar só é visto fora da Terra.” Enquanto se manteve fiel ao seu conhecimento dos mistérios, Paulo lutou contra o Cristianismo.
Por meio da revelação vivida em Damasco, Paulo compreendeu que é possível contemplar o Cristo sem se elevar aos mundos espirituais, pois ele realmente descera à Terra. E a partir desse momento ele sabia que os discípulos de Jesus Cristo diziam a verdade, porque o grande ser solar havia descido do céu à Terra.
Se o Cristo não tivesse aparecido na Terra, se só continuasse apenas como deus do Sol, a humanidade teria entrado em decadência. Os homens teriam, cada vez mais, acreditado que só existem as coisas materiais, que o Sol é apenas matéria, as estrelas apenas são formadas por matéria. Porque os homens se esqueceram totalmente do fato de que eles mesmos desceram da existência pré-terrestre, do mundo espiritual estelar.
Porém, a vida da humanidade só suportaria durante um tempo limitado mais que uma certa soma de pensamentos materialistas. Tal soma de pensamentos que dizem tudo é “material” só pode durar por um tempo definido. Se, por exemplo, todos os homens acreditassem durante um século inteiro que tudo era constituído apenas de matéria, eles perderiam a força do espírito no seu interior e se tornariam doentes, paralisados. Isto aconteceria, se o Cristo não tivesse em sua infinita compaixão descido do mundo espiritual à Terra.
Vocês dirão que muitas pessoas ainda não querem saber nada sobre o Cristo, não seguem uma religião cristã. O que acontecerá com eles? Por que não estão paralisados, fracos, doentes?
Vejam, meus caros amigos, o Cristo apareceu na Terra, no acontecimento do mistério do Gólgota, não apenas para dar uma doutrina aos homens, mas para realizar o fato da sua aparição na Terra. Ele morreu para todos os homens. A constituição física de todos os homens foi melhorada e salva por meio do mistério do Gólgota, também daqueles que não acreditaram em Cristo.
Até agora não importava que alguém fosse chinês, japonês, hindu e não quisesse saber nada sobre o Cristo: pois o Cristo morreu para todos os homens.
Isto não será possível da mesma forma no futuro, porque para a humanidade será cada vez mais decisivo, em comparação ao que foi até agora, qual o conhecimento que se tem. Com a evolução da humanidade, surgirá mais e mais a necessidade de todos os homens adquirirem um certo conhecimento dos seres espirituais e da Vida espiritual.
Esse conhecimento, que leva todos os homens a penetrar no mundo espiritual, é aquele a que aspira a pesquisa antroposófica. E com esse conhecimento poder-se-á também reconhecer o Cristo.
Quando a Antroposofia for assimilada corretamente, poder-se-á falar sobre o Cristo de maneira tal que a descrição seja compreensível para todos os homens.
Com a forma usada até hoje para anunciar o Cristianismo, os missionários que foram à África, à Ásia, conseguiram talvez converter algumas pessoas, mas as grandes massas o rejeitaram, porque não podiam entendê-los.
Que tipo de religião tinham os povos? Eram religiões que tinham surgido dentro de um povo e só podiam ser compreendidas por esse mesmo povo, porque veneravam algum lugar sagrado ou uma personalidade santa dentro do próprio povo. Enquanto os egípcios veneraram o deus de Tebas era obrigatório peregrinar a Tebas, onde se podia venerar esse Deus em seu santuário. Enquanto Zeus foi venerado em Olímpia, devia-se ir a Olímpia, para nesse lugar venerar o Zeus. Da mesma forma deve o muçulmano viajar para Meca.
Algo disso se conservou também no próprio cristianismo. Quando entendermos corretamente o cristianismo, saberemos que o Sol brilha para todos os homens. Ele brilha sobre Tebas, sobre Olímpia, sobre Meca. Pode-se ver fisicamente o sol de qualquer lugar e por isso também o grande ser solar, o Cristo, pode ser venerado espiritualmente.
E assim, a Antroposofia mostrará aos homens que aquele ser, que antes do mistério do Gólgota só podia ser alcançado mediante capacidades supra-sensíveis, pode, a partir do mistério do Gólgota, ser alcançado pela força cognitiva, que deve ser conquistada na própria terra.
Será novamente compreendida a palavra que diz: “os reinos dos céus desceram à Terra”. Não mais se falará de forma mística sobre o reino milenar, mas será compreendido que o que se procurava antigamente no sol, agora se encontra na Terra. “ E diremos: “o Cristo está entre nós desde o mistério do Gólgota, porque desceu à Terra e mora entre os homens na Terra.”
O que os discípulos sentiram como o mistério de Pentecostes, poderemos sempre sentir novamente: “ o Cristo desceu à Terra e em nosso coração nasce aquela força que assegura aos homens a imortalidade.” Porém, deveremos levar a sério as palavras do Cristo em sua verdade profunda, por exemplo: “eu estarei convosco todos os dias até o fim dos tempos.” E quando pudermos levar a sério essas palavras em sua profundidade espiritual, também nos será possível adquirir o seguinte conhecimento: “o Cristo não esteve aqui na terra apenas no começo da nossa era, ele está aqui sempre, e Ele fala conosco se queremos ouvi-Lo.”
Para isso, deveremos aprender novamente, por meio da ciência espiritual, a ver o espiritual em qualquer objeto material. O espiritual por trás da pedra, o espiritual por trás da planta, o espiritual por trás dos animais, dos homens, das nuvens, das estrelas, por trás do Sol. Se encontrarmos novamente, através da matéria, o espírito em sua realidade, abriremos a nossa alma humana para a voz do Cristo que quer falar conosco, se quisermos ouvi-lo.
E a Antroposofia pode falar sobre o espírito que permeia toda a natureza. Por isso ela pode também afirmar que o espírito atua em toda a história terrestre da humanidade, e pode dizer que a Terra só recebeu o seu sentido através do mistério do Gólgota.
O sentido da Terra estava no Sol antes do mistério do Gólgota. Desde o mistério do Gólgota o sentido da Terra está unido com a própria Terra. Isto, a Antroposofia gostaria de levar à humanidade como um mistério pentecostal sempre presente.
E os homens, se estiverem dispostos a procurar o mundo espiritual com a Antroposofia, poderão então, de forma adequada aos tempos atuais, reencontrar também o Cristo como o onipresente.
Se em nossos tempos não se inclinarem para o conhecimento espiritual, os homens irão perder o Cristo. Até agora o cristianismo não precisou do conhecimento. O Cristo morreu para todos os homens. Ele não renegou os homens. Se hoje os homens rejeitarem o Cristo no conhecimento, eles então renegarão o Cristo.
Como o nosso encontro aqui em Oslo foi nesta época da festa de Pentecostes, eu queria lhes falar sobre o mistério do Cristo, relacionando-o com o mistério de Pentecostes.
Às vezes há quem opine que a Antroposofia é uma inimiga do cristianismo. Quem perceber realmente o espírito da Antroposofia, descobrirá que será ela justamente que abrirá novamente os ouvidos, o coração e a alma do homem como um todo para o mistério do Cristo.
Meus caros amigos, o destino da Antroposofia quer se ligar ao do cristianismo. Para isso é necessário que os homens de hoje se elevem, além da palavra morta que lhes fala do Cristo, para aspirar a um conhecimento que os conduza à própria luz do Cristo vivo, não daquele histórico que séculos atrás vivera na Terra, mas daquele que hoje e em cada momento do futuro vive e viverá na Terra entre os homens, porque se transformou de deus em seu irmão divino.
Assim, queremos receber em nossos pensamentos pentecostais o anseio de procurar através da Antroposofia o caminho ao Cristo vivo e sentir como em cada antropósofo pode ser renovado o mistério primordial de Pentecostes. Que em seus corações surja o conhecimento do Cristo que aquece e ilumina nas línguas de fogo do conhecimento cristão universal.
Façamos com que o nosso caminho em direção ao espírito através da Antroposofia seja ao mesmo tempo o caminho em direção ao Cristo através do espírito. E se isto for assumido por uma minoria de pessoas com seriedade então será cada vez maior o número de homens em que esse mistério de Pentecostes criará raízes no presente e especialmente no futuro.
Então acontecerá o que a humanidade tanto precisa para a sua saúde e para a sua cura: falará então, para uma nova compreensão humana, o espírito salvador que Cristo enviou para curar as doenças das almas dos homens. Então, meus caros amigos, virá aquilo que a humanidade precisa:
O Pentecostes Universal!
(*) Nota do tradutor: Rudolf Steiner proferiu esta palestra em Oslo, por ocasião da fundação da Sociedade Antroposófica na Noruega. Ele deve ter usado este estilo simples de freses curtas para facilitar a tradução para o norueguês, o que facilitou também a tradução para o português.
(**) Observação da remetente: Calvário (em aramaico Gólgota) é o nome dado à colina que na época de Cristo ficava fora da cidade de Jerusalém, onde Jesus foi crucificado. Calvaria em latim, Κρανιου Τοπος (Kraniou Topos) em grego e Gûlgaltâ em transliteração do aramaico. O termo significa “caveira”, referindo-se a uma colina ou platô que contém uma pilha de crânios ou a um acidente geográfico que se assemelha a um crânio. O Novo Testamento descreve o Calvário como perto de Jerusalém (João 19:20), e fora das muralhas da cidade (Epístola aos Hebreus 13:12). Isso está de acordo com a tradição judia, em que Jesus foi também enterrado perto do lugar de sua execução.
O imperador romano Constantino, o Grande construiu a Igreja do Santo Sepulcro sobre o que se pensava ser o sepulcro de Jesus em 326 –335, perto do lugar do Calvário. De acordo com a tradição cristã, o Sepulcro de Jesus e a Verdadeira Cruz foram descobertos pela imperatriz Helena de Constantinopla, mãe de Constantino, em 325. A igreja está hoje dentro das muralhas da Cidade Antiga de Jerusalém, após a expansão feita por Herodes Agripa em 41-44, mas o Santo Sepulcro estava provavelmente além das muralhas, na época dos eventos relacionados com a vida de Cristo.
Dentro da Igreja do Santo Sepulcro há uma elevação rochosa com cerca de 5m de altura, que se acredita ser o que resta visível do Calvário. A igreja é aceita como o Sepulcro de Jesus pela maioria dos historiadores e a pequena rocha dentro da igreja como o local exato do Monte Calvário, onde a cruz foi elevada para a crucificação de Jesus.