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Histórias

Um conto de Natal

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Era uma vez um menino e uma menina; irmão e irmã. O irmão tinha oito anos; ela sete. E eram muito infelizes e muito pobres, porque já não tinham nem pai nem mãe. Algumas semanas antes, o pai, que era guarda florestal de um conde muito poderoso, tinha saído de casa para ir ao bosque. No meio do bosque havia um lago e, como nesse inverno fazia muito frio, a ponto de ter congelado a água, o gelo, que nesse lugar era mais delgado, partiu-se. O pobre guarda foi para o fundo e morreu afogado.
 Ao cabo de alguns dias, encontraram, mesmo ao lado do lugar onde ele se afogara, o cão do guarda sentado em cima do chapéu e da espingarda do dono. Quando a mulher do guarda soube da desgraça que tinha acontecido, partiu-lhe o coração de desespero e morreu. Ficaram assim, pois, as crianças sozinhas no mundo, vivendo unicamente das esmolas que lhe davam na aldeia. E continuaram a viver na sua casa deserta e fria do guarda. Juntamente com o cão. Mas, ao chegar a véspera de Natal, sentiram-se demasiado sós naquela casa escura e fria, e , acompanhados do cão, saíram para a rua, apesar do grande frio e da neve que caía tão abundantemente, que lhes chegava até o peito. Tinham esperanças de encontrar o Menino Jesus, de quem sua mãe lhes falava e contava tantas coisas, todos os anos. O menino recordava-se de, no ano anterior, e naquela mesma noite, ter ido com o pai ao castelo do conde e de ter sonhado com o que lá vira, durante muito tempo. E assim se dirigiram para o castelo, ambos a tremer de frio. A irmãzinha quase não podia andar de tão cansada que estava, e as lágrimas não a deixavam ver nada. O irmão, embora fosse menor e fraco, tinha de ajudá-la a levantar-se a cada momento: aquecia-lhes as mãozinhas com o hálito prometendo-lhe muitos brinquedos, que encontrariam no castelo. Mas, por fim, também se cansou e de boa vontade se teria sentado na neve para descansar um pouco. Mas, então, o velho cão começou a saltar alegremente em volta dele, ladrando e agitando a cauda, como se quisesse dizer: ”lá não estamos longe, coragem, vamos!” e como as crianças, apesar disso, não se punham a caminho, começou a ladrar com mais força e chegou até a arreganhar os dentes. Porém, mais adiante, as crianças não puderam realmente continuar mais. E eis que, de repente, encontraram um outro menino.
 Era tão pequeno e tão fraquinho como a pequerrucha; ainda estava mais pobremente vestido, e apesar do intenso frio que fazia, ia descalço e sem nada na cabeça, que era muito linda e com uns belos cabelos longos e encaracolados.
 -Para onde vais? – perguntou o menino com uma voz débil e com medo.
 - Ah! È que estás descalço! – disse a menina.
 - Pois estou – respondeu, chorando o outro.
 - Sabes o que vamos fazer? – disse o irmão á irmã. – Já que não podes andar, dá-lhe as tuas botas e nós te levaremos no colo. Queres?
 Ficou assim combinado, e desta maneira puderam ir mais depressa. Chegaram diante do castelo. De fora, viam-se, através das janelas, todas iluminadas, a grande árvore de Natal, com magníficos presentes, toda enfeitada de ouro e prata e cheia de frutas cristalizadas. As crianças conseguiram entrar escondidas, no castelo: através dos corredores, bem aquecidos, e sem que ninguém os tivesse visto, puderam chegar até a sala onde estava a árvore de Natal. Em volta estavam o conde, a condessa, os filhos e muitos convidados, todos elegantemente vestidos. A princípio ninguém deu pela presença das pobres crianças que ficaram deslumbradas perante a magnificência da árvore e dos brinquedos. Só estranhavam que os filhos do conde não estivessem alegres, nem rissem de satisfação ao receber tais presentes.
 - Oh! Que contentes ficaríamos eu e a minha irmã, se tivéssemos a décima parte de tudo isto – disse em voz baixa o filho do guarda florestal ao outro menino. Este sorriu, mas, não pode responder porque, precisamente nesse momento, os dono da casa deram presença das crianças. Ao vê-las tão mal vestidas, toda a gente se afastava de repugnância.
 - De onde vieram vocês, seus ciganos? – berrou o conde, furioso; e ordenou aos criados que os pusessem na rua.
 -Calma, marido, calma! – disse a condessa. – Vão já. Mas repare como estão rolos! Talvez tenham fome!... E hoje é noite de Natal. Podemos dar-lhes umas roupas... Ainda há alguma, trazida pela comissão da árvore de Natal para crianças pobres... E mandem que os acompanhe ao quarto dos criados para comerem qualquer coisa.
 Sem esperar resposta do conde, a condessa dirigiu-se a um canto da sala, onde havia montes de roupas e calçados para as crianças, e deu alguns aos pequenos... isto é, ela não – porque não queria aproximar-se deles – mas um criado, a quem ordenou que levasse as crianças para fora da sala.
 - Muito obrigado! – disse o menino dos cabelos encaracolados- mas os meus companheiros e eu queríamos t5ambém alguns desses lindos brinquedos e alguns doces.
 - Como! O que? – exclamaram, surpreendidos, o conde a condessa e todos os convidados. E os filhos do conde puseram-se a gritas:
 - Não... Não! Isso não! É nosso! Não faltava mais nada! São nossos. Contenten-se com os vestidos que lhes deram e com a comida em vez de estarem pedindo outras coisas!... Tivessem tido mais juízo nos pais que escolheram!
 Muito aborrecido o conde e os convidados puseram as crianças fora da sala, enquanto a condessa mandava abrir a janela para sair o cheiro de miséria que elas haviam deixado ali. Os pequenos choravam, mas ninguém se compadeceu, e então, cheios de fome, tiveram de deixar o castelo.
 O cão esperava-os no pátio, e as crianças, sempre chorando, confiarem nele mais uma vez para que os guiasse. Dirigiram-se para o bosque.
 A princípio o irmão e a irmã tinham, muito medo, ao verem-se no meio de tamanha escuridão, entre os pinheiros e os abetos. O menino desconhecido tranqüilizou-os. E enquanto falava, apareceu a lua no céu; o luar brilhava por entre os ramos das árvores, e que belo espetáculo se ofereceu aos seus olhos! Não era uma árvore de natal como a do castelo do conde, mas centenas delas as que tinham  diante dos olhos, recamadas de pérolas e diamantes resplandecentes. Chegaram ao lago. Ali tornaram a ver milhares de estrelas, nas águas azuis e cristalinas... Que lindo! O cão sentou-se na margem, olhando o espelho das águas e as crianças, cansadas, foram sentar-se ao seu lado.
 - Ah! Se agora o Menino Jesus viesse ao nosso encontro! – disse, baixinho a menina ao irmão.
 Naquele instante, o outro pequeno levantou-se e, oh! Milagre! – já não estava pobremente vestido, nem tinha aspecto de miséria. Vestia uma túnica bordada a prata, como a dos anjinhos. Em torno da formosa cabecinha luzia-lhe uma coroa de luz. Das mãozinhas, irradiava um esplendor como a das estrelas... E, em lugar do bosque. Apareceu, de repente, um palácio rela todo iluminado, de mármore branco e ouro, pratas e pedras preciosas; e das portas, abertas de par em par, vinha um calor suave e aromas de incenso. Do palácio saíram anjos, voando; por ordem do menino, pegaram nos dois irmãos e levaram-nos para o meio das preciosas naves. Uma vez ali calçaram os pezinhos nus da menina com sapatos de ouro. Depois, vestiram os dois com vestidos resplandecentes, que se assemelhavam á túnica do menino desconhecido.
 - Então és o Menino Jesus?
 - Sim, eu sou Cristo. Porque vos compadecestes do menino pobre e esfarrapado, e partilhaste com ele a vossa pobreza; porque sois órfãos e passais fome e frio, entrais no reino dos céus e nele celebrareis o Natal.
 Depois, levaram os meninos para o pé da árvore de Natal do céu, tão bela e tão resplandecente como só no céu podia haver. Ao lado dela, a árvore do conde não era nada. Das mãos do Menino Jesus receberam vários presentes, cada qual mais bonito e S. Pedro deu-lhes de comer e de beber. E depois... depois vieram os seus pais que não estavam vestidos como os criados do conde, mas como anjos, porque eram bem aventurados. As crianças ficaram para sempre no céu com seus pais e os outros santos e brincavam muito com o Menino Jesus... Mas no bosque, no lugar onde eles tinham parado para descansar encontraram apenas as roupas deles, e espalhou-se a notícia de que os lobos os tinham comido. Ao fim de algum tempo, apareceu ali uma capelinha, sem que ninguém soubesse quem a tinha feito, e no altar, entre os anjos, que contavam o Glória in Excelsis, viam-se duas caras, que se pareciam muito com as dos filhos do guarda florestal.
 Querem saber, agora, que foi feito do conde, da condessa e de seus filhos? Deus os castigou por terem expulsado de casa as pobres crianças e o Menino Jesus. O coração converteu-se-lhes em pedra e toda a vida sofreram muito; e os doces, que não quiseram dar aos pequeninos pobres, causaram-lhes distúrbios no estômago de tal maneira que nunca estavam fartos, sem, contudo, nunca terem vontade de comer. Doentes e abatidos, deixaram o castelo que ficou deserto e abandonado, passando a ser ninho de corujas.