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Histórias

Graças ao Menino (Rosane L. P. Pamplona)

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Rosane L. P. Pamplona

Era época de natal. Pelos gelados caminhos do norte da Europa, seguia uma caravana de ciganos. Assustados com aquele inverno precoce e mais rude do que o habitual, os ciganos resolveram mudar o curso e tentar terras mais quentes.

Um dia, acampados à beira da estrada, perceberam a ameaça de uma iminente tempestade de neve; às pressas, recolheram suas coisas e seguiram com suas carroças, sem perceber que haviam deixado para trás um deles, um menininho que se havia abrigado numa espécie de gruta que encontrara. O pequeno cigano ali ficou, dormindo inocentemente por algumas horas, até a borrasca passar. Quando acordou deu-se por conta de que estava sozinho. Chamou, chamou, mas só sua voz ressoava no silêncio daquele mundo amortecido pela grossa coberta de neve.
Resolveu esperar com paciência que o fossem buscar, mas logo sentiu fome e tentou achar algo para iludir seu estômago. Em vão. Nenhuma fruta teria foras para crescer naquele frio, nenhum bichinho ousaria a neve clemente. As horas foram passando e o menino, enregelado e faminto, decidiu sair dali e procurar ajuda na cidade mais próxima.
Andou, andou e enfim chegou a um pequeno povoado. Cheio de esperanças, bateu à porta da primeira casa que encontrou.
Ali morava uma velha senhora, que havia passado o dia todo limpando e arrumando a casa, pois era véspera do Natal e ela queria que tudo estivesse impecável para festejar o sagrado nascimento do menino. Assim, quando foi abrir a porta e viu aquela criança suja, mal vestida, ficou aborrecida e o enxotou, dizendo:
- Cuidado com esses pés imundos! Você não vê que pode sujar meu tapete, estragar todo meu trabalho? Saia daqui, seu pequeno vadio!
O garoto nem ousou responder nada; achou melhor tentar a porta da segunda casa.
Ali morava um marceneiro, que havia passado o dia todo reformando seus móveis, pois, afinal, era véspera de Natal, e tudo deveria estar perfeito para festejar o nascimento do Menino. E ele estava justamente lixando a última de suas cadeiras quando ouviu baterem. Contrariado com aquela interrupção, foi abrir e, vendo o cigano, gritou-lhe:
- Como ousa atrapalhar meu serviço? Fora daqui, não vê que estou ocupado?!
O menino, assustado, saiu correndo o quanto lhe permitiram suas perninhas cansadas e assim chegou á terceira casa.
Ali moravam uma jovem viúva e seu filho pequeno, quando ela viu o cigano, amendrontou-se; um garoto como aquele não podia ser boa companhia para seu filho. Era melhor evitar problemas, principalmente na noite em que se festejava o sagrado nascimento do Menino. E assim pensando, gritou, batendo a porta:
- Vá embora, você vai assustar meu filho!
O menino cigano, transido de fome e frio, arrastou-se pela neve, tentando afastar-se daquele povoado, que nenhum conforto lhe dera. Já ia longe, quando avistou uma última casinha. Sentindo que, se não fosse socorrido, morreria ali mesmo, para lá se dirigiu, até cair, sem forças, na soleira da casa.
Ouvindo o barulho, o velho mestre da aldeia, que ali morava, abriu a porta e recolheu o menino. Aqueceu-o ao pé da lareira, deu-lhe de comer e beber e reconfortou-o com amor.
Enquanto isso, com a noite chegando...
A velha senhora, sentada no seu sofá impecavelmente escovado, admirava o brilho de suas louças, a limpeza de sua sala, porém... não se sentia feliz. Doía-lhe a solidão. “De que adianta”, refletia ela, “ter a casa tão arrumada se ninguém compartilha comigo na noite de natal? Bem que eu podia ter deixado aquele garoto entrar. Pensando bem, um pouco de neve no tapete não faria mal algum e agora eu teria alguém com quem conversar”. E assim arrependida, abriu o armário da cozinha, escolheu o maior pão que ali encontrou e saiu à procura do menino.
O marceneiro, por sua vez, acabara o trabalho. Sentado na sua cadeira nova, entediava-se, mergulhado em remorsos: ”Para que tantas cadeiras, se todas ficam vazias na noite de Natal? Bem que eu podia ter deixado aquele garotinho entrar. Talvez ele até me ajudasse e agora estaríamos festejando juntos.” E assim pensando, foi até sua adega, escolheu seu melhor vinho e saiu à procura do menino.
Entrementes, a jovem viúva observava o filho brincando sozinho e, arrependida, lamentava-se: ”Que pena ter mandado aquele cigano embora! Fui tola e medrosa. Uma criança tão pequena nada nos faria do mal, ao contrário, só nos traria alegria”. E assim as melhores castanhas que encontrou na despensa e, carregando no colo seu filho, saiu á procura do menino.
Assim, seguindo as pegadas que o menino deixara na nave, todos eles se encontraram diante da casa do velho mestre. Ele abriu a porta e convidou-os a entrar. Lá dentro, ao pé do fogo, eles viram o menino, que, contente, sorriu-lhes. O velho mestre então perguntou-lhes, já que estavam, todos lá e tinham trazido tantas coisas boas, porque não sentavam ao redor do fogo e festejavam juntos o Natal.
E assim foi que, naquele ano, todos eles tiveram um Natal mais farto, mais alegre e caloroso, graças ao menino.
Assim pode ser também o Natal de todos nós que abrirmos a porta do nosso coração para quem sofra de frio ou fome, qualquer espécie de frio ou de fome.
Assim será, graças ao Menino!