Histórias
Jorge, o cavaleiro (Jakob Streit)
Jakob Streit
(tradução Ruth Salles)
No longínquo Oriente, na época que se seguiu ao aparecimento de Jesus Cristo, havia guerreiros audazes, chamados “Cavaleiros da Justiça”. Incógnitos, cavalgavam pelos remos e apareciam sempre para defender os aflitos e os que estavam em dificuldades.
Nessa época, existia uma bela cidade à beira-mar chamada Silena. Mas a tristeza e o sofrimento dominavam esse reino há muito tempo, E que, quando o mar ficava revolto, surgia das água um dragão. Meio voando, meio se arrastando, movia-se pela terra adentro, roubava animais dos rebanhos, devastava choupanas e também devorava pessoas. Ninguém, nem mesmo os soldados do rei, tinha até então conseguido combater esse monstro. O rei mandou perguntar a um sábio, que vivia nas montanhas, o que deveria ser feito. O eremita aconselhou:
- Quando o mar ficar agiotado amarrem dois carneiros na margem, bem no local onde o monstro costuma surgir. Ele vai devorá-los e mergulhar de novo nas águas.
O conselho foi seguido. Quando o dragão tornou a aparecer, devorou os dois carneiros e voltou para o fundo do mar. Contudo, no ano seguinte, depois de devorar outros dois carneiros, ele não se contentou e se arrastou de novo pela terra adentro, devastando tudo, como fazia antes.
Mais uma vez, o rei mandou mensageiros ao sábio eremita. Quando este soube de tudo, ficou aflito e, de início, não queria dar conselho algum. Mas, diante da insistência dos mensageiros, deu-lhes uma triste notícia:
- Para apaziguar de novo esse dragão, é preciso que se faça o sacrifício de uma donzela.
O rei e o povo, ao saberem, ficaram desesperados, mas nada se podia fazer. Todas as donzelas da cidade foram chamadas para tirar a sorte.
No entanto, do meio do povo se ergueu um murmúrio, porque a filha do rei não ia participar do sorteio. As portas do castelo, uma multidão gritava em altos brados:
- A princesa Eleisa também! A princesa Eleisa também!
O rei não teve como se defender das exigências do povo, e assim Eleisa se ajuntou às demais donzelas da cidade, para tirar a sorte. O mais graduado dos conselheiros do rei segurava um saquinho de veludo negro, que continha enfiadas uma porção de varetas bem fininhas. Em sua metade superior, que aparecia para fora do saquinho, todas as varetas eram iguais. A metade inferior era pintada de branco, menos a de uma vareta, que era rubra como o sangue: era a que indicava o sacrifício. Quem tirava uma vareta branca sentia o coração bater de alegria. Eleisa tirou a varetinha rubra.
Por mais que seu pai e sua mãe chorassem, Eleisa foi conduzida até a “Pedra do Dragão”, do lado da qual o monstro costumava surgir. Quando, porém os soldados quiseram prender a jovem a uma argola de ferro, ela pediu:
- Não me prendam à pedra. Não vou fugir, e eu mesma vou vendar os olhos com meu véu branco.
Assim dizendo, puxou o fino véu sobre o rosto e sentou-se no rochedo. No alto da muralha do castelo, ficaram seus pais, implorando aos antigos deuses pagãos que acontecesse um milagre e sua filha fosse salva.
O mar cresceu em grandes ondas. Repentinamente, no alto de uma colina próxima, surgiu um cavaleiro montado num corcel branco. Sua armadura reluzia ao sol. Certamente ouvira falar dos acontecimentos, pois ao ver a donzela na “Pedra do Dragão”, deu um grande brado, e seu cavalo disparou colina abaixo. Já se podia ver a cabeça do dragão emergindo das espumas do mar. Quando, porém, ele se arremessou para fora d’água, o cavaleiro postou-se à sua frente, brandindo a espada e empunhando a lança. Após violenta luta, ele trespassou o corpo escamoso do monstro. Este, já morrendo, caiu para trás e afundou no mar, deixando atrás de si um escuro rastro de sangue.
No momento em que começara o tinir das armas, Eleisa tirou o fino véu e assistiu de perto a assustadora luta. Depois de tudo terminado, ela viu o cavaleiro apear do cavalo, fincar a espada na terra e se ajoelhar em oração. Para surpresa de todos, ele fez o sinal de urna cruz na direção em que o dragão afundara, e em seu escudo havia também uma cruz desenhada.
A princesa ainda estava trêmula do susto sofrido. Quando, porém, o cavaleiro estendeu sua mão forte e a ajudou a descer do rochedo, uma grande tranqüilidade e um novo ânimo inundaram seu coração.
O povo, que assistira tudo, gritava de alegria e foi indo em bandos na direção da pedra. Eleisa e seu salvador foram rodeados e festejados. O pai e a mãe, felizes, abraçaram a filha. Diante de todos, o rei perguntou ao cavaleiro:
- Nobre cavaleiro e corajoso salvador, diga-me como se chama, para que eu lhe possa agradecer, e diga- me em nome de quem você lutou!
O cavaleiro, então, apontou para a cruz em seu escudo e disse:
- Jorge é meu nome. Luto em nome de Cristo, e o que me dá forças é Micael, o guerreiro celeste que combate as trevas!
O povo concentrou-se em volta de Jorge, desejando saber mais a respeito do novo símbolo. Então, o cavaleiro subiu à “Pedra do Dragão” e anunciou ao povo a mensagem da cruz de Jerusalém.
O rei gostaria que Jorge ficasse em seu reino e recebesse a filha como esposa. Contudo, ao terceiro dia, ele se despediu, partindo para novas missões. Na despedida, Eleisa amarrou seu véu branco na ponta da lança, como lembrança, e ele tremulou como uma flâmula, até bem longe, quando o cavaleiro desapareceu atrás da colina.
(extraido do livro “Quero ser seu Irmão” )